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Uma coisa que logo se tornou evidente nos primeiros meses de 1972 foi que a péssima experiência durante a gestação de Lifehouse apenas fortaleceu a vontade de Pete Townshend de fazer do próximo álbum do The Who um ambicioso trabalho conceitual. Mas não sem antes separar um tempo para se recuperar e reunir forças para o próximo passo.

Após um período de férias, a banda volta ao estúdio somente no meio do ano, reservando o Olympic Studios durante maio e junho e retomando a acertada parceria com o produtor Glyn Johns. Das canções registradas nessas sessões, algumas delas faziam parte do projeto Lifehouse, enquanto outras demonstravam uma mudança de rumo ainda meio incerta. Eram elas, "Relay", "Join Together", "Too Much Of Anything", "Love Reign O'er Me", "Long Live Rock", "Put The Money Down", "Wasp Man" e "Is It In My Head?". O resultado final, apesar de excelente, fazia lembrar em muito o estilo de Who's Next - não que isso fosse algum demérito, pelo contrário - mas passar o resto de sua carreira na sombra de um de seus trabalhos mais impactantes não se encaixava bem com o ideal criativo da banda.

Uma das canções gravadas no Olympic, no entanto, se tornou a gênese de um novo projeto imaginado por Pete. "Long Live Rock", composta para o filme que marcou a estréia cinematográfica de Keith Moon - That'ill Be The Day - inspirou o compositor a focar suas idéias numa mini-ópera que encapsulasse toda a história do The Who, tudo que o grupo já havia feito até então. Rock Is Dead - Long Live Rock acabaria sendo deixado de lado, e sua canção-título só ressurgiria dois anos mais tarde na coletânea Odds & Sods. Deixado de lado, mas não totalmente: na esteira desse enredo veio outro, ainda mantendo um caráter retrospectivo mas agora centrado na vida de um jovem londrino no começo dos anos sessenta. Na cabeça de Pete a jogada de caracterizar o The Who (então em vias de completar seu décimo ano de existência ), de representar seus integrantes e como eles mudaram com o tempo, foi inventar um protagonista que - ao invés de esquizofrênico - tinha sua personalidade divida em quatro, cada uma delas representada por um tema e por um ritmo em particular. Pete seria o lado desajustado, excluído; Roger o lado valentão, rebelde; John o romântico, sonhador; e Keith, o irresponsável e lunático.

Para aproveitar o material gravado no Olympic, e enquanto a gravação do novo álbum não tinha início, alguns singles passaram a ser divulgados. "Join Together", remanescente de Lifehouse, foi o primeiro deles, lançado em 17 de junho no Reino Unido e em 8 de julho nos Estados Unidos e alcançando respectivamente a nona e a décima-sétima colocação nas paradas de sucesso. "Relay" seria o próximo, e apesar de não conseguir a mesma repercussão do compacto anterior, ajudou a manter a banda sob os olhos do público.

Em agosto o Who começa a ensaiar pesado para uma subsequente turnê pela Europa. Tais ensaios tinham uma boa justificativa: além de ter passado os sete meses anteriores sem fazer shows, a banda pretendia apresentar pela primeira vez ao público europeu as canções de Who's Next, além de inéditas como "Relay". A turnê tem início em setembro, passando pela Alemanha, Escandinávia, Itália e oeste europeu; um dos shows mais marcantes acontece em Paris, diante de 400,000 fãs no festival anual do Partido Comunista francês.

Mas não demoraria muito para a ópera-rock Tommy voltar a rodear a banda em uma de suas inúmeras incarnações - desta vez como um álbum produzido pelo norte-americano Lou Reizner, contando com os 104 instrumentistas da Orquestra Sinfônica de Londres e mais um coral de 60 vozes. Lançado em outubro, contou com a participação dos quatro integrantes do Who, além de astros da música especialmente convidados como Ringo Starr, Rod Stewart, Richie Havens e Steve Winwood. O papel do garoto surdo, cego e mudo, que inicialmente ficaria a cargo de Stewart, acaba caindo novamente nas mãos de Roger Daltrey, que - em comparação com a obra original - demonstra sua incrível evolução como intérprete, reflexo principal do trabalho intenso do Who na estrada.

Em dezembro o grupo volta ao estúdio para o início das gravações do novo e ainda não finalizado projeto, agora encarado como um álbum duplo devido à grande quantidade de composições apresentadas por Pete. Kit Lambert foi chamado para ajudar na produção e na clarificação de certos aspectos do roteiro (como ele fizera com Tommy - e fracassara em fazer com Lifehouse), mas o produtor, ainda abusando na mistura de álcool e drogas, acaba discutindo com Daltrey e as sessões de gravação sofrem uma interrupção abrupta. Pete se decepciona mais uma vez com seu antigo mentor, e já comprometido com a composições das canções e a gravação de seus vocais, teclado, guitarra e sintetizador, termina sozinho com a árdua tarefa de produzir o novo álbum.



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Ilustrações por Marco Antônio Monteiro | Textos por Vinícius Mattoso | © Todos os direitos reservados
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